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Dádiva da Adoração a Deus

Adorar a Deus é um gesto simples, mesmo que muitas vezes não seja tão fácil assim, pelo menos quando se refere à verdadeira adoração que é feita alegremente, espontaneamente e em plena sinceridade de coração. Pois, apesar de simples, historicamente a humanidade sempre encontrou grandes dificuldades em oferecer a Deus verdadeira e exclusiva adoração. Continue lendo...

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Biografia - G. K. Chesterton

Um dos maiores escritores católicos da história da Igreja nasceu em 29 de maio de 1874, Kensington, Londres. Seus pais se chamavam Edward Chesterton e Marie Louise Keith. Gilbert Keith Chesterton era um escritor profundo, caridoso e de uma inteligência honesta e brilhante. Teve apenas um irmão, Cecil Chesterton, com quem travou calorosos debates ao longo da infância e juventude.


Apesar de possuir uma inteligência incomum, Chesterton não foi um bom aluno. Estudou no Saint Paul’s College. Péssimo aluno, um professor certa vez disse a ele: “Sabe de uma coisa, Chesterton? Se pudéssemos abrir sua cabeça, não encontraríamos o cérebro, e sim um pedaço de manteiga[1]”. O que o professor não sabia era que aquele jovem que se sentava na última fila tinha miopia e enxergava com dificuldade.

Fortemente inclinado às letras, criou, juntamente com Bentley e Lucien Oldershaw, um grupo para estudar e debater literatura. O Junior Debating Club, como ficou conhecido, foi fundado no dia 1 de julho de 1890. O grupo rapidamente se solidificou e atingiu o número de 10 amigos. Criaram, em seguida, a revista The Debater, que teve dezoito números publicados. Em cada edição eram impressos de 60 a 100 exemplares. Em 1982, Chesterton escreveu um poema que foi muito elogiado e recebeu o prêmio Milton. Tratava-se de um poema sobre São Francisco Xavier. Frasista genial, Chesterton criava frases paradoxais que expressavam a clareza de sua compreensão do mundo. Se citássemos todas, teríamos que escrever e compilar volumosos livros. Talvez seja melhor deixá-las em seus livros, como ele as criou e as uniu. Mas aqueles que costumam sublinhar as frases de seus livros para facilitar a recuperação ou memorização, iriam, sem dúvida, se surpreender com o fato de que ao final da leitura teriam sublinhado o livro todo.

Em 1893, iniciou um curso de arte no Slade School of Art, mas rapidamente desistiu.
“Estudante de uma escola de arte ou faz um monte de trabalho ou não faz então coisa alguma. Eu pertencia, com os outros simpáticos companheiros, ao segundo grupo; e isto me arrastava algumas vezes para a companhia de pessoas que eram muito diferentes de mim, mas que eram ociosas por motivos outros.[2]”
Sua adolescência foi marcada pelo agnosticismo. “Eu era pagão aos doze anos de idade e um perfeito agnóstico aos dezesseis [3]”. Chesterton escreveu em sua autobiografia:

“Não me orgulho de crer no demônio, ou melhor dito, não estou orgulhoso de conhecer o demônio. Conheci-o por minha própria culpa; seguia por um caminho que, se houvesse persistido nele, poderia ter me conduzido à adoração do demônio ou o demônio sabe a quê.[4]”
Apesar de uma fase de aridez espiritual, Chesterton não ficava contente com os discursos dos materialistas e espiritualistas, que ora criticavam o cristianismo por ser demasiado pessimista, ora o criticavam por ser muito otimista. Chesterton comentou isso no capítulo 'Paradoxos do Cristianismo', publicado em 1908 no livro Ortodoxia:

“O fato, porém, extraordinário era o seguinte: Eles me provavam no Capítulo 1, para minha plena satisfação, que o Cristianismo era demasiado pessimista; e depois, no Capítulo 2, começavam a me provar que ele era, em grande parte, otimista demais. Uma acusação contra o Cristianismo dizia que ele, com suas mórbidas lágrimas e terrores, impedia que os homens buscassem a alegria e a liberdade no seio da natureza. Mas outra acusação era a de que ele confortava os homens com uma providência fictícia e os situava num mundo cor-de-rosa e branco.

Um grande agnóstico perguntava por que a natureza não era suficientemente bonita e por que era difícil ser livre. Outro grande agnóstico objetava que o otimismo cristão, "o manto do faz-de-conta tecido por mãos piedosas", escondia de nós o fato de que a natureza era feia e era impossível que ela fosse livre. Um racionalista mal terminara de chamar o cristianismo de pesadelo e outro já começava a chamá-lo de falso paraíso [5].”
Ele não conseguia compreender a lógica daqueles discursos vazios e carregados de criticas motivadas por questões subjetivas e sentimentalistas.

Apesar de ter sido criado no Anglicanismo, Chesterton está na fileira daqueles que — juntamente com outros grandes homens, como John Henry Newman e Henry Edward Manning — se converteram ao catolicismo através do movimento Anglo-católico. “A teoria Anglo-católica pretende que a Inglaterra permaneceu católica apesar da Reforma [6]”. Converteu-se no ano de 1922. Apesar de possuir idéias claramente católicas, sua conversão demorou por causa de Frances Blogg, sua esposa, que era Anglicana e temia a conversão do marido. Frances Blogg se converteu ao catolicismo no ano de 1926.

“Casou-se com Frances Blogg em 1901. Infelizmente não tiveram filhos. Ambas as famílias não viam com bons olhos o casamento. Não tanto pela pessoa de Chesterton, a quem tinham estima e confiança, mas pelo fato de ele conseguir sustentar uma família com o pouco que recebia dos seus trabalhos literários. Chesterton, em uma carta a sua mãe, Marie Louise, se referiu assim a Frances: “[...] é, com certeza, o tipo de mulher que lhe agrada, que se pode chamar de, segundo creio, ‘mulher das mulheres’, com bom humor, pouca lógica e muita simpatia, e não está contaminada por nenhum excesso ofensivo de saúde física.” Tinha consciência de que "o casamento cristão não é algo que nos é sugerido pelas condições sociais do nosso entorno; é algo que nos é sugerido por Deus.” [7]
Frances padecia de artrite na coluna, doença que iria acompanhá-la a vida toda, apesar dos esforços de Chesterton para levá-la a todos os especialistas.

Com a crescente demanda de trabalhos, e pelo fato de Chesterton ser, por natureza, desorganizado e esquecido, foi necessário contratar uma secretária para auxiliar as atividades. Contrataram em 1926 a senhorita Dorothy Collins, que tinha 32 anos de idade e 9 anos de experiência. Dorothy, além de saber taquigrafia e escrever à máquina com uma velocidade considerável, sabia dirigir carro, o que a princípio não agradou a Chesterton, avesso a carros. Ela rapidamente se tornou amiga da família. Em sua Autobiografia, Chesterton escreveu sobre Dorotthy: “fazia-se de secretária, chofer, guia, filósofa e, sobretudo, de amiga [8]”. Ela acompanhou os Chestertons a vida toda. O carinho que eles nutriam por ela era tão grande, que eles a consideravam uma filha.
“Tinha muitos gastos, pois pagava a escola de algumas crianças que ele e Frances apadrinharam. Alguns dos relatos do Padre Brown se devem a essa pressão econômica, assim como às consideráveis contas do jornal G.K.'s Weekly. Eu lhe dizia: “só nos restam 100 libras no banco”. “Está bem, vamos escrever outra história do Padre Brown” e ele o fazia na velocidade de um raio, a partir de umas poucas notas que escrevia num envelope e terminava um ou dois dias depois.” [9]
Um das fontes de renda da família eram os artigos que Chesterton escrevia e publicava nos jornais. Escreveu para os jornais Daily News, Illustrated London News e The New Witness. Em 1926, juntamente com seu irmão Cecil Chesterton, fundou inclusive uma revista que se chamou G.K.’s Weekly, na qual Chesterton publicava artigos sobre Distributismo. Foi neste periódico que o escritor de A Revolução dos Bichos (1945) e 1984 (1949), George Orwel, publicou seu primeiro artigo, em 1928.

Rapidamente, Chesterton ganhou destaque na Inglaterra e em outros países. Todos reconheciam nele um extraordinário talento literário. Ao longo de sua vida, escreveu mais de 80 livros (com destaque para uma biografia sobre Santo Tomás de Aquino (1933), a qual recebeu um elogio de Étiene Gilson, e outra sobre São Francisco de Assis(1923); para a novela O Homem que foi quinta-feira (1908) e para as séries de contos policiais do Padre Brown) e 4.000 artigos, além de ter proferido dezenas de conferências, inclusive no exterior. Viajou a diversos países, dentre eles Estados Unidos, Itália, Palestina, Canadá e Polônia. Em todos os países onde ia era muito bem recepcionado. “Durante uma conferência em Chicago, uma pessoa gritou que não o ouvia; Chesterton levantou os olhos e disse: ‘não se preocupe, irmão, não está perdendo nada’ [10]”.

Em sua segunda ida a Roma, foi recepcionado pelo Papa Pio XI. Sua secretária comentou que Chesterton havia ficado tão impressionado com a recepção que o Papa Pio XI lhe fizera, que nada fez nos dias posteriores. O próprio Gilbert comenta:

“Vi Sua Santidade Pio XI” três vezes; na primeira, em uma audiência privada; na segunda, em uma reunião semiprivada de várias pessoas; na terceira, entre as multidões que lotavam [a praça de] São Pedro no dia da beatificação dos mártires ingleses. [...] De repente, saiu uma figura robusta envolta em uma capa, de rosto quadrado e com óculos; começou a falar sobre meus livros, comentando com grande generosidade um trecho que eu havia escrito sobre São Francisco de Assis [11]”.
Chesterton ficou tão profundamente marcado com aquela viagem que escreveu o livro The Resurrection of Rome (1930).

Chesterton era um polemista nato, mas era sempre respeitoso e afetuoso com seus adversários. Não se tem relato de que seus oponentes tenham guardado mágoa ou raiva de sua pessoa. Nos debates sempre levava vantagem por sua clareza lógica ao demonstrar as incoerências dos oponentes. Tinha um humor elegante e refinadíssimo, e suas piadas causavam grandes gargalhadas na platéia. Travou discussões longuíssimas com diversos intelectuais de sua época, como Bernard Shaw, H.G. Wels, G.S. Street, etc. Tornou-se grande amigo de Hillaire Belloc, a quem estimava muito, fato que levou Shaw a apelidá-los de “monstro Chesterbelloc”.

Fazia questão de caricaturar sua aparência e pessoa. Em todas as oportunidades que podia fazer uma piada sobre sua obesidade, fazia-o. Certa vez, quando lhe pediram para deixar publicar uma caricatura sua no G.K.’s Weekly, ele autorizou com uma condição: que ele aparecesse de costas, ordenhando uma vaca. Noutra ocasião, quando uma senhora havia lhe perguntado, enquanto ele caminhava pelas ruas de Londres, por que não estava na frente de batalha, ele olhou para a senhora e disse: “se olhar bem por este lado, verá estou.”. Numa conferência Chesterton disse aos participantes: Quero lhes assegurar de que na realidade não sou gordo; é o microfone que está me amplificando [12]”. São muitos os relatos engraçados de sua vida.

Chesterton escreveu praticamente a respeito de tudo, e em diversos gêneros literários. De poesias a livros que podem ser considerados tratados de filosofia e, sem exagero, carregados de teologia digna dos mais profundos teólogos católicos; escreveu também contos policiais, ensaios, critica literária, etc. Discorria facilmente sobre temas que iam desde a instituição da família e o homem das cavernas até o pensamento de Santo Tomás de Aquino. Sua erudição e versatilidade para tratar sobre diferentes temas com profundidade é característica de sua mente genial. Além de apresentar argumentos racionais e lógicos, Chesterton recorria a paradoxos e ao humor para expor a ortodoxia. Suas obras foram traduzidas - e ainda são - para diversos idiomas, dentre eles, francês, alemão, holandês, checo, polaco, espanhol, italiano e hebreu. Até na Rússia é possível encontrar admiradores de Chesterton.

Além de ter escrito biografias de santos e ter feito desenhos de ilustração para seus próprios livros, Chesterton ainda marcou a literatura policial com a criação do detetive Pe. Brown. O fato mais curioso é que ele se baseou num personagem real, o sacerdote John O’Connor, do qual era grande amigo.

Chesterton se inspirou no Pe. John O’Connor para criar seu detetive famoso, o Padre Brown. Pe. John O’Connor era de origem irlandesa e estava alocado na Igreja de St. Anne de Keighley, em Yorkshire. Chesterton estava de férias em Yorkshire quando se conheceram. Rapidamente se tornaram amigos, e, segundo Maise Ward, biógrafa de Chesterton, era “talvez a amizade mais íntima da vida de Gilbert.”[13]

Depois de escutar dois estudantes de Cambridge que comentavam que os padres, por estarem fechados no claustro, nada saberiam sobre o mal no mundo, Chesterton se inspirou para criar o famoso sacerdote-detetive. Segundo Chesterton, a experiência sacerdotal, através da confissão, permite aos sacerdotes conhecerem o lado mais obscuro da natureza humana.

“E surgiu em minha mente a vaga ideia de dar um fim artístico a esses cômicos despropósitos que eram, ao próprio tempo, trágicos, e construir uma comédia na qual um sacerdote aparentemente não saberia nada, não obstante conhecesse o crime melhor que os criminosos. Coloquei essa ideia essencial em um conto pequeno e improvável chamado “A cruz azul”, continuando através das séries intermináveis de contos com os quais afligi o mundo. Em resumo, permita-me a séria liberdade de tomar o meu amigo e dar-lhe uns quantos golpes, deformando seu chapéu e seu guarda-chuva, desordenando sua roupa, modelando seu rosto inteligente numa expressão cheia de fatuidade e, em geral, disfarçando o padre O’Connor de Padre Brown”[14].
Foi publicada uma série de contos. O primeiro conto escrito foi A Cruz Azul (1911), publicado junto com outros contos no livro A inocência do Pe. Brown. Nesse conto Chesterton surpreendentemente nos relata que o sacerdote-detetive desvenda o crime depois do criminoso, Flambeau, ter atacado a razão.

Ao longo dos contos, Chesterton nos apresenta as características do Pe. Brown:

“O pequenino Padre não era interessante de ser contemplado: tinha a cabeleira castanha arrepiada e o rosto arredondado e sem expressão.”[15]; “Silencioso, era um homenzinho curiosamente simpático”[16].
Sou um homem, e, por isso mesmo, tenho todos os demônios do mundo no meu coração” [17], dizia Pe. Brown. Em homenagem a Chesterton, Pe. O’Connor publicou em 1937, um ano depois da morte daquele, a obra Father Brown: on Chesterton.

Uma de suas obras mais importantes — e que está traduzida para o português — é Ortodoxia, publicada em 1908. Nesse livro-resposta, Chesterton rebate a crítica de G.S. Street, que o havia desafiado a expor ‘sua filosofia’.

“Este livro foi escrito para ser lido como complemento a Heretics [Hereges] e mostrar o lado positivo além do negativo. Muitos críticos se queixaram daquele livro dizendo que ele simplesmente criticava as filosofias correntes sem oferecer nenhuma filosofia alternativa. Este livro é uma tentativa de responder a esse desafio. Ele é inevitavelmente afirmativo e, por isso mesmo, inevitavelmente autobiográfico.”[18]
Ortodoxia (1908) é uma defesa rigorosíssima e inteligente da ortodoxia. Chesterton a escreveu antes de ingressar no grêmio da Igreja Católica. Nessa obra eterna ele expõe a incoerência do pensamento moderno e a confusão mental desses pensadores. Chesterton demonstra que a ortodoxia, apesar de cambalear, mantém-se firme:

“É sempre simples cair; há um número infinito de ângulos para levar alguém à queda, e apenas um para mantê-lo de pé. Cair em qualquer um dos modismos, do agnosticismo à Ciência Cristã, teria de fato sido óbvio e sem graça. Mas evitá-los a todos tem sido uma estonteante aventura; e na minha visão a carruagem celestial voa esfuziante atravessando as épocas. Enquanto as monótonas heresias estão esparramadas e prostradas, a furiosa verdade cambaleia, mas segue de pé.”[19]
Outra obra densa de Chesterton é O Homem Eterno (1905). “A ideia deste livro, em outras palavras, é que, depois de realmente fazer parte da Cristandade, a segunda melhor coisa é situar-se realmente fora dela” [20]. Chesterton faz referência, nesta frase, aos críticos que não saem da Igreja para compreendê-la verdadeiramente e ficam numa posição intermédia. Não conseguem compreender o edifício da fé cristã: “a melhor relação com a nossa casa espiritual é ficar suficientemente perto para amá-la. Mas a segunda melhor relação é ficar suficientemente longe para não odiá-la” [21]. “A tese destas páginas é que, embora o melhor juiz do cristianismo seja o cristão, o segundo melhor seria alguém mais parecido com um confucionista” [22]. Esta obra é tão profunda, que é comum sentir dificuldade em sua compreensão e leitura. Pe. O connor assim se refere à obra: “A densidade do assunto que trata faz com que sua leitura seja em geral difícil e minuciosa”[23]. Esta obra teve um impacto profundo na conversão de C.S.Lewis: “li O Homem Eterno de Chesterton e pela primeira vez vi toda a concepção cristã da história exposta de uma forma que parecia ter sentido”[24]. Talvez o título seja proposital. Talvez Chesterton quisesse que essa obra fosse lida eternamente.

Chesterton foi admirado e elogiado por vários escritores, políticos e religiosos de seu tempo.

Étienne Gilson:

“Chesterton foi um dos pensadores mais profundos que jamais existiram. Era profundo porque tinha razão, e não podia deixar de tê la; mas também não conseguia deixar de ser modesto e amável; por isso, deixava os que concordavam com ele pensarem que estava certo e era profundo; quanto aos outros, desculpava se por ter razão, e fazia se perdoar a profundidade com o engenho, pois era só o que eles conseguiam ver nele.[25]";
Antonio Gramsci: “Chesterton era um grande artista.” [26];

T.S. Eliot: “Se tivesse de afirmar sua qualidade essencial, diria ser a do tipo do senso comum triunfante – aquele gaudium de veritate [...]”[27];

C.S. Lewis: “Seu humor era do tipo que eu mais gosto – sem “piadas” inseridas numa página como passas num bolo, e menos ainda num tom comum (o que não suporto) de frivolidade e jocosidade” [28];

Bernard Shaw: “um gênio colossal” [29];

Hillaire Belloc:

"A verdade tinha para ele a atração imediata de um apetite. Chesterton tinha fome de realidade. Mas o que é mais importante: ele não podia conceber de si mesmo a não ser satisfazendo essa fome; não lhe era possível hesitar aceitar cada nova porção de verdade; não lhe era possível considerar nada válido que não estivesse conectado com a verdade como um todo [...] [30]”.
No Brasil foi admirado por Alceu Amoroso Lima, Gustavo Corção, Gilberto Freire, entre outros. Gustavo Corção dedicou ao pensador inglês o livro Três Alqueires e uma vaca (1946) onde expõe o pensamento do genial escritor.

Criou, juntamente com seu amigo Hillaire Belloc, uma teoria econômica baseada nos princípios evangélicos e nos ensinamentos Papais, especialmente na encíclica do Papa Leão XIII, Rerum Novarum. O Distributismo propõe o direito à propriedade privada. No dia 17 de setembro de 1926, Chesterton e Belloc criaram a Liga Distributista. Essa liga tinha como objetivo “restaurar a propriedade”, segundo pronunciou Chesterton no discurso inaugural. Chesterton foi eleito o primeiro presidente da Liga. Ele escreveu uma série de artigos no G.K.’s Weekly, os quais foram compilados no livro The Outline of Sanity (1926).

Gustavo Corção assim se referiu à teoria distributivista:

“A ideia central é a da defesa da pequena propriedade e da pequena empresa contra o gigantismo, que já no seu tempo ameaçava a sociedade, e que no nosso tornou-se uma calamidade declarada. Afirmava o direito à posse, não como uma concessão, mas ousadamente, como outorgado por Deus; admitia o capital enquanto indispensável reserva, mas não admitia, de modo algum, o capitalismo, porque a principal característica desse regime a seu ver está na raridade e não na abundância do capital. O capitalismo é uma situação em que quase ninguém possui” [31].
Em 1914, Chesterton ficou gravemente doente. Durante uma conferência, passou mal e teve de ser levado para sua casa. Ao chegar, deitou repentinamente sobre a cama, que quebrou. Frances ficou preocupadíssima e rapidamente a impressa relatou o ocorrido. Apesar de não se saber ao certo a origem da doença, os efeitos eram gravíssimos. Chesterton ficou vários dias sem consciência. Num breve momento de lucidez, Frances o perguntou se ele sabia quem estava cuidando dele. Naturalmente, Frances esperava que ele dissesse que era ela, mas Cheterton disse: “Deus”. Frances comentou posteriormente que isso havia sido um duro golpe em sua humildade. Chesterton recobrou a saúde na véspera da Páscoa do mesmo ano.

Outro duro golpe para Chesterton foi a morte de seu irmão, Cecil Chesterton, ocorrida no dia 6 de dezembro de 1918. Cecil, que havia sido um inseparável amigo de Chesterton, morreu na 1º Guerra Mundial. O escritor católico, profundamente magoado, - diria revoltado – dedicou um poema a seu irmão em que dizia que os que lutaram verdadeiramente pela Inglaterra tinham as tumbas muito longe, mas aqueles que governam a Inglaterra, todavia, não possuem tumba alguma.

Chesterton faleceu aos 62 anos, no dia 14 de Junho de 1936, em sua casa, localizada na cidade de Beaconsfield, em Buckinghamshire, Inglaterra. Um gigante de 2,09 metros de altura e pesava uns 140 quilos. Tinha um coração pequeno – no sentido literal –, mas não em caridade e afetuosidade. Seu coração não conseguia bombear sangue suficiente para aquele gigante. Faleceu em sua casa após ter recebido o sacramento da Unção dos Enfermos. Frances, numa carta ao Pe. John O’Connor (“Pe. Brown”), assim se expressou: “Nosso adorado Gilbert faleceu nesta manhã às 10h:20min. Esteve inconsciente durante algum tempo, mas recebeu os últimos sacramentos e a Extrema Unção quando ainda tinha consciência”[32]. Coincidência ou ironia do destino, Chesterton morreu no domingo dentro da Oitava de Corpus Christi, festividade na qual havia sido batizado 14 anos antes.

Sua Santidade, o Papa Pio XI, através do Cardeal Eugenio Pacelli – futuro Pio XII -, escreveu por meio de um telegrama: “O Santo Padre está profundamente consternado com a morte de Gilbert Keith Chesterton, devoto filho da Santa Igreja, dotado defensor da Fé Católica. Sua Santidade oferece paternais condolências ao povo da Inglaterra, promete orações pelo falecido amigo e outorga sua Benção Apostólica” [33]. Ironicamente, Chesterton recebeu o título de Fidei Defensor, que havia sido concedido por Leão X ao rei Henrique VIII antes deste se rebelar contra a Igreja.

Outro futuro papa que foi admirador de Chesterton e inclusive dedicou ao escritor britânico uma das cartas de uma série dedicada a personalidades reais ou fictícias, sob o título de ‘Ilustríssimos Senhores’, na década de 1970, foi o cardeal Albini Luciani, antes de se tornar João Paulo I.

“Querido Chesterton, tu e eu não duvidamos em colocarmo-nos de joelhos, mais diante de um Deus mais atual que nunca. Só ele, de verdade, pode dar uma resposta satisfatória a estes três problemas, que são para todos os mais importantes: “Quem sou eu?”; “De onde venho? ”; “Para onde vou? [34]”, Escreveu o primado de Veneza Albino Luciani.
Em 2009, num congresso realizado e organizado em Oxford, com o tema “A santidade de G. K. Chesterton”, foi apresentada às autoridades eclesiásticas a proposta de se iniciar o processo de estudo para a beatificação de Chesterton.

Suas obras ainda estão sendo traduzidas para diversos idiomas. No Brasil há algumas iniciativas que começam a ganhar maior visibilidade por meio do site www.chestertonbrasil.org, que possui como objeto: “reunir e difundir o pensamento de Gilbert Keith Chesterton (1874-1936) no Brasil”.

Se Chesterton é ou não santo, somente a Igreja pode dizê-lo, mas se for válida sua máxima de que:

“o Santo é um medicamento, porque ele é um antídoto. Certamente é por isso que o santo é muitas vezes um mártir, ele é confundido com um veneno, porque ele é um antídoto. Ele geralmente será procurado para restaurar a sanidade do mundo, exagerando o que o mundo ignora, que nem sempre é o mesmo elemento em todas as idades. No entanto, cada geração procura o seu santo por instinto, e ele não é o que as pessoas querem, mas sim o que o povo precisa”.[...] Por isso, é o paradoxo da história, que cada geração é convertida pelo santo que contradiz mais[35].”
Esta pode ser aplicada a ele. Chesterton foi o paradoxo do seu tempo. Aqueles que o conheceram pessoalmente se encantaram com sua alegria e bom humor. Se for a vontade de Deus, teremos, em breve, mais um escritor católico beato. Se Chesterton caminhou pelas trilhas da heterodoxia, foi por um breve momento, o suficiente para sentir saudades do reto caminho: a ortodoxia.

Chesterton era uma "máquina" intelectual. Escreveu mais de 4.000 artigos para jornais. Não bastasse a infinidade de artigos, escreveu mais de 100 livros e aproximadamente 200 contos, quase todos ditados para sua secretária.

Destacam-se ainda as biografias sobre Tomás de Aquino e Francisco de Assis, além do livro O homem que foi quinta-feira (The Man Who Was Thursday) e a série de livros ficcionais que contam as peripécias protagonizadas pelo personagem Padre Brown. Sua obra literária é tão versátil quanto marcante. Além de Ortodoxia, em que expõe os pilares da fé cristã, Chesterton escreveu Everlasting Man [O homem eterno], obra responsável por levar um jovem ateu, C. S. Lewis, ao cristianismo. Também é atribuída a Chesterton, decisiva influência na vida de líderes de movimentos de libertação como Michael Collins (Irlanda), Mahatma Gandhi (Índia) e Martin Luther King (Estados Unidos).

Chesterton era extremamente consciente de sua fé. Mesmo quando tachado de retrógrado, não se intimidava em defender o ideário cristão e opunha-se, sem pedir licença, ao encantamento que o socialismo, o relativismo, o materialismo e o ceticismo despertavam na intelligentsia européia da primeira metade do século XX. Gilbert Keith Chesterton faleceu em 14 de junho de 1936, em sua residência, na cidade de Beaconsfield (Reino Unido), ao lado de sua esposa Frances Blogg, deixando marcas inesquecíveis em mestres da literatura como Ernest Hemingway, Graham Greene, Jorge Luis Borges, Gabriel García Márquez, Marshall McLuhan, Dorothy L. Sayers, Agatha Christie, Orson Welles e T. S. Eliot, que certa feita afirmou: "Chesterton merece o direito perpétuo a nossa lealdade".


Certa vez o jornal London Times pediu a alguns escritores que respondessem à pergunta: "O que há de errado com o mundo?".

Chesterton enviou a resposta mais sucinta:

Prezados Senhores:
Eu.
Atenciosamente, G. K. Chesterton
(Chesterton, G. K. - Ortodoxia - São Paulo: Mundo Cristão. Edição Centenária 1908 - 2008)

Obras:

Alguns Livros em Português:

  • Ortodoxia
  • A desvantagem de ter duas cabeças
  • O Homem que era Quinta-Feira
  • Barbárie de Berlim
  • A superstição do divórcio - Tradução do Professor Carlos Ramalhete
  • São Francisco de Assis e Santo Tomás de Aquino

Poesia
  • Greybeards at Play (1900)
  • The Wild Knight and Other Poems (1900)
  • The Ballad Of The White Horse (1911)
  • Poems (1915)
  • Wine, Water And Song (1915)
  • The Ballad of St. Barbara and Other Poems (1922)
  • Poems (1923)
  • The Queen of Seven Swords (1926)
  • Gloria in Profundis (1927)
  • Ubi Ecclesia (1929)
  • Christmas Poems (1929)
  • New and Collected Poems (1929)
  • New Poems (1932)

Ficção

  • The Napoleon of Notting Hill (O Napoleão de Notting Hill) (1904), romance
  • The Club of Queer Trades (1905), contos
  • The Man Who Was Thursday (O homem que era quinta-feira) (1908), romance
  • The Ball and the Cross (1909), romance
  • Manalive (1912), romance
  • The Flying Inn (1914), romance
  • The Man Who Knew Too Much (O homem que sabia demais) (1922), contos
  • Tales Of The Long Bow (1925), contos
  • The Return of Don Quixote (1927), romance
  • The Sword of Wood (1928), contos
  • The Poet and the Lunatics (1929), contos
  • Four Faultless Felons (1930), contos

Série Father Brown

  • The Innocence Of Father Brown (1911), contos
  • The Wisdom Of Father Brown (1914), contos
  • The Incredulity Of Father Brown (1926), contos
  • The Secret Of Father Brown (1927), contos
  • The Scandal Of Father Brown (1935), contos

Teatro

  • Magic (1913)
  • The Judgment of Dr. Johnson (1927)
  • The Turkey and the Turk (1930)
  • The Surprise (1952)

Veja a relação completa de todos os livros de G. K. Chesterton em:


[1] PEARCE, Joseph. G.K.Chesterton: sabidúria e inocencia. Madrid: Encuentro. 2009. p. 34.
[2] Conto The Diabolist, publicado revista A Ordem, V. 47, n. 1, 1952. Tradução de Oswaldo Tavares Ferreira.
[3] CHESTERTON, G. K. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008. p. 140.
[4] CHESTERTON, G.K., Autobiografia, p. 69.
[5] CHESTERTON, G. K. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008. p.142-143.
[6] GIORDANI, Igino. Los grandes conversos, Barcelona: Editorial Casulleras. 1945. p. 193
[7] SILVA, Diego Guilherme da; DAMASCO, Letícia Lopes. Chesterton, ressuscitá-lo ou não?. Artigo publicado no site www.Chestertonbrasil.org.
[8] PEARCE, Joseph. G.K.Chesterton: sabidúria e inocencia. Madrid: Encuentro. 2009. p. 421.
[9] Ibdem, p. 450.
[10] Ibdem, p. 490.
[11] Ibdem, p. 472.
[12] Ibdem, p. 492.
[13] Ibdem, p. 123.
[14] Ibdem, p. 125.
[15] CHESTERTON, G.K. A Inocência do Pe. Brown. São Paulo:Lpm, 2011. p. 179.
[16] Ibidem, p. 156.
[17] Ibidem, p. 191.
[18] CHESTERTON, G. K. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008. p. 16.
[19] Ibdem, p. 168.
[20] CHESTERTON, G.K. O Homem Eterno. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. p. 9.
[21] Ibdem, p. 11.
[22] Ibdem, p. 11.
[23] PEARCE, Joseph. G.K.Chesterton: sabidúria e inocencia. Madrid: Encuentro. 2009. p. 389.
[24] Ibdem, p. 390.
[25] PAINE, Scott Randall. Chesterton e o Universo. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008. 205.
[26] GRAMSCI, Antoni. Cartas do carcere. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1987. 168-169 p.
[27] PAINE, Scott Randall. Chesterton e o Universo. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008. p. 206
[28] Ibdem, p. 208.
[29] Ibdem, p. 207.
[30] Ibdem, p. 207.
[31] CORÇÃO, Gustavo. Três alqueires e uma vaca. Editora Agir, 1961. p. 249-254.
[32] PEARCE, Joseph. G.K.Chesterton: sabidúria e inocencia. Madrid: Encuentro. 2009. p. 589.
[33] Ibdem, p. 595.
[34] Ibdem, p. 199-200.
[35] CHESTERTON, G.K. Santo Tomás de Aquino: biografia. Tradução de Carlos Ancêde Nougué. São Paulo: Ltr, 2003. p. 30-31.

Divina Dádiva